Rio de Janeiro, 25 de outubro de 2013.
André de Lima Cardoso, 19 anos, Pavão-Pavãozinho – junho/2011
Thales Pereira Ribeiro D’Adrea, 15 anos, Fogueteiro – junho/2012
Jackson Lessa dos Santos, 20 anos, Morro do Fogueteiro – junho/2012
Mateus Oliveira Casé, 16 anos, Manguinhos – março/2013
Paulo Henrique dos Santos, 25 anos, Cidade de Deus – Março/2013
Aliélson Nogueira, 21 anos, Jacarezinho – abril/2013
Amarildo de Souza, 43 anos, Rocinha – julho/2013
Laércio Hilário da Luz Neto, 17 anos, Morro do Alemão – Agosto/2013
Israel Meneses, 23 anos, Jacarezinho – agosto/2013
Os nomes citados são uma mostra dos assassinatos de homens, jovens em sua maioria, cometidos pela Polícia Pacificadora do Estado do RJ. Na madrugada da última quinta-feira, dia 17 de outubro, mais um jovem foi vítima da truculência policial em Manguinhos. Paulo Roberto Pinho de Menezes de 18 anos foi espancado até a morte. Na manhã seguinte, uma jovem foi baleada por policiais que buscavam controlar, com armas de fogo, moradores revoltados que atiravam pedras. A Polícia Militar do Rio de Janeiro possui um histórico de assassinatos e mentiras neste território, como no caso de Seu Paulo, homem trabalhador, conhecido dono de padaria, assassinado em 2012 na Rua Leopoldo Bulhões por policiais, que pelas redes televisivas ficou conhecido como mais um traficante.
O Estado brasileiro viola direitos em Manguinhos cotidianamente, assim como em outras favelas: policiais se dirigem às mulheres com palavras de baixo calão quando as mesmas não se deixam influenciar por suas cantadas; impedem a realização de festas, inclusive nas residências dos moradores; proíbe que os jovens ouçam funk; determinam “toque de recolher”, impedindo o ir e vir dos moradores garantido na Constituição Federal; invadem casas sem mandado judicial.
No caso do pedreiro Amarildo, assassinado na favela da Rocinha, ficou claro para a sociedade que órgãos públicos de investigação tentaram culpar a vítima e sua família, para esconder o crime cometido pelo Estado. Fato semelhante começa a acontecer também no caso do jovem Paulo Roberto, filho de pais trabalhadores de baixa renda, a mãe vendedora ambulante e o pai gari. O Estado agiu como violador de direitos ao tentar justificar a ação da polícia citando a “atitude suspeita dos jovens abordados”, o uso de drogas e a passagens da vítima pela polícia. Não há justificativas para agressão e homicídio policial que impossibilitam o acesso à justiça e aos Direitos Humanos.
A sociedade começa a perceber que a regra das ações policiais na favela é oprimir moradores jovens, negros de baixa renda. O Estado capitalista faz dessa violência e violação de direitos, uma prática institucional.
Contudo, a Polícia Militar, não é a única violadora de direitos. A Saúde também tem sua cota de responsabilidade, quando, por exemplo, Quando não apresenta um laudo a partir de uma perícia clinica isenta, e reafirma com todas as letras a versão policial, como no caso de Paulo Roberto. A UPA Manguinhos que recebeu o jovem já morto após a agressão, não permitiu a entrada da mãe do jovem na unidade de saúde, mas garantiu a livre circulação dos policiais envolvidos no crime; além disso, a instituição reiterou a versão dos policiais, de que o jovem teria apenas um “pequeno corte na boca fruto da queda”, versão que desmentida durante o velório do jovem, que tinha pelo menos três hematomas visíveis no rosto além do citado “pequeno corte”.
Nós, favelados, vivemos em um Estado de Exceção há séculos, e essa condição está se alastrando para o asfalto. Podemos comprovar isso através das prisões arbitrárias realizadas contra mais de 180 ativistas políticos em manifestações por melhores condições de trabalho no setor educação, devido ao retorno de Lei de Segurança Nacional, utilizada na ditadura. O mesmo Estado que mata na favela, prende arbitrariamente no asfalto. Enquanto Paulo Roberto foi assassinado, outro Paulo foi vítima do Estado Brasileiro na mesma semana: Paulo Roberto de Abreu Bruno, professor e pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública, da Fundação Oswaldo Cruz – instituição localizada no território de Manguinhos – preso de forma arbitrária, ser ter cometido nenhum crime, o que caracteriza também uma ação política da Polícia Militar. Enquanto realizava registros fotográficos para fins de pesquisa durante a manifestação dos professores, no último dia 15 de outubro, Paulo Bruno foi acusado de formação de quadrilha.
Vemos assim, que os trabalhadores estão sendo oprimidos diariamente: Na favela as pessoas são mortas, no asfalto elas são presas ou levam bala de borracha. Mas, independente da forma de repressão/opressão, não podemos nos manter calados diante a tanta violência Institucional, já que é papel do Estado garantir direitos. Dessa forma exigimos que sejam realizadas dez ações concretas pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a Assembleia Legislativa do RJ (ALERJ), o Ministério Público Estadual (MP), a Ordem de Advogados do Brasil (OAB) e demais instituições e organizações:
1. Investigação e divulgação da causa da morte dos jovens Paulo Roberto Pinho de Menezes e Mateus Oliveira Casé, e do tiro recebido pela jovem Juliane Karoline Cavalcante – ALERJ, OAB, MPE;
2. Debate amplamente divulgado para os moradores de Manguinhos sobre o papel da Polícia Militar, incluindo as Unidades de Polícia Pacificadoras, frente à continuidade dos assassinatos e a violação de direitos nas favelas – FIOCRUZ;
3. Exigimos debate com a Secretaria de Estado de Habitação, Secretaria Municipal de Habitação e Empresa DE Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro –EMOP – sobre o a péssima qualidade das obras do PAC-Favelas, a política de habitação vigente, suas consequências e os processos de remoções/realocações/indenizações;
4. Que as políticas públicas em Manguinhos não sejam mediadas pela Polícia Militar. Na prática, as prometidas “parcerias entre os governos – municipal, estadual e federal – e diferentes atores da sociedade civil”, anunciadas pela UPP, não tem ocorrido. Exigimos reuniões permanentes entre moradores e as diferentes esferas de governo, com ampla divulgação pelas favelas de Manguinhos, para construção de políticas públicas. Defendemos que essas reuniões sejam públicas, divulgadas em diferentes meios de comunicação comunitária, dialogadas com movimentos sociais e NÃO sejam determinadas apenas pela UPP;
5. Debate e proposição de ações pelo setor saúde, incluindo a Fiocruz, frente às distorções e impactos do Estado de exceção: autos de resistência; ausência de perícias, notificações e laudos feitos pelo SUS em casos de violência; os efeitos do uso de gás lacrimogênio;
6. Revisão de leis de exceção, tais como a Lei de Segurança Nacional (7.170/83), lei anti-máscara (6.528/13), lei de formação de quadrilha (9.034/95);
7. Maior transparência sobre a gestão de projetos para Jovens em áreas pacificadas, especificamente o programa Caminho Melhor Jovem, que tem como territórios pilotos Manguinhos e Cidade de Deus – ALERJ, MPE;
8. Exigimos que o setor saúde, incluindo a Fiocruz, realize diagnósticos participativos sobre as diversas formas de violências em Manguinhos e sua relação com os determinantes sociais da saúde (habitação, saneamento, educação, etc.);
9. Fim da ilegalidade: na revista de mulheres por policiais homens; na falta da identificação do policial; na invasão de casas sem mandato policial – ALERJ, MPE;
10. Responsabilizar o governo Estadual pelas mortes ocorridas nos territórios ditos pacificados – ALERJ, MPE;
BASTA AO EXTERMÍNIO DO POVO NEGRO DE MANGUINHOS
E A TODAS VIOLÊNCIAS DESTE ESTADO FASCISTA!
Convidamos a todos para se unirem a nós nessa luta, participando do ALERTA MANGUINHOS: Sarau Cultural de Manguinhos, a ser realizado no dia 26 de outubro, a partir das 16h, na Praça de Vila Turismo.
Subscrevem esta Carta as seguintes organizações, instituições e movimentos:
(enviar nomes para o e-mail forumanguinhos@gmail.com)
Organização Mulheres de Atitude – OMA
Fórum de Juventudes do Rio de Janeiro – FJRJ
Fonte: Fórum Social de Manguinhos